Relato – 1001miglia 2016 – Richard P. Dunner

Não tendo conseguido o Randonneur 5000 em 2015 por não conseguir pedalar a Fleche em 2014 e não poder participar no primeiro BRM 1000 das Bandeiras em 2014 devido a rigidez ao pé da letra dos BRMs brasileiros, me coloquei como nova meta pedalar um LRM por ano.

Os LRMs tem regras de qualificação própias muitas vezes muito menos rígidas.
O primeiro LRM em pauta seria o PBP 2015, onde teria que qualificar como Super Randonneur, e as metas os LRMs 1001miglia 2017 e MGM 2018.

Acabei brevetando o PBP pela segunda vez em 2015 e fiquei automaticamente qualificado para o 1001miglia 2017 e imediatamente começaram os preparativos.

Fui ler mais uma vez o relato dos 2 gaúchos, que participaram no 1001miglia 2008, Rubens Gandolfi e Isaac Chedid que conheci no BRM 300 em Caxias do Sul de 2008, quando estavam se preparando para ir para Italia. Também consegui ler outros relatórios de participantes. Sintomático em todos ouve menção das paisagens bonitas, inúmeras e as vezes íngremes subidas, e que a organização da prova deixava a desejar.

Consegui achar o percurso do 1001miglia 2012 no Roadbook, acessando o site http://www.1001migliaitalia.it. e percebi que a partir da quinta etapa teria uma altimetría brava, representando um total de aproximadamente de 15000 m para o total do percurso.

O material

Devido a minha idade e peso e sabendo que as subidas são o meu ponto fraco comecei a pensar na relação de marchas que ia utilizar. Do LEL 2013 tinha alguma experiência,. Naquela prova chegamos a enfrentar subidas de ate 20 % na Escócia, acabei usando 12 x 28 atrás e 42 x 28 na frente. Quase relações de MTB, que para Italia, devido ao comprimento da prova de 1600 km achava que ainda teria que reduzir mais, e usar uma bicicleta mais leve e curta de traseira que subisse bem.

Na duvida entre as bicicletas finalmente acabei escolhendo a minha Klaus Poloni Spirit, que é uma bicicleta muito curta e ágil. Também decidi tirar o mais peso possível dela. Tirei o garfo de aço e substituí por um garfo de carbono Columbus levíssimo de somente 320 gr (- 580 gr). Troquei o canote de selim Dura Ace 7400 e coloquei um Thomson Masterpiece curto de alumínio, que somente pesa 150 g (- 80 gr). Troquei o Selim Brooks Swift de aço por um Swift de titanio que somente pesa 380 gr (-120 gr). No fim acabei trocando todo o grupo colocando o meu Dura Ace 7800 de 10 marchas substituindo o Ultegra 6600 (-350 gr) e colocando um cassette XTR 12×34 que somente pesa 230 gr (-80 gr). No todo conseguiu tirar um pouco mais de 1 kg de peso deixando a bicicleta vazia com menos de 9 kg. Sabendo que teria 2 drop bags descidi usar a bolsa da Vo Joaquina Jumbo, que pesa 400 gr olhando para que o peso total da bolsa com conteúdo não ultrapassasse os 3,5 kg. Pessoalmente teria que perder 5 kg. No fim, o único que não consegui foi tirar os meus 5 kg pessoais, rs rs (mas neste quesito os Italianos me ajudariam mais tarde….). A relação de marchas que consegui compor no fim foi 50 x 33 na frente e 14 x 34 atrás. Na menor marcha então menos que 1 para 1.

E uma prova de 5 dias, uma jornada, em um percurso desconhecido precisa de iluminação, GPS e opção de recarga de eletrónicos a caminho. Descidi colocar a minha roda com dínamo Son e usar a luz com tomada USB Busch + Mueller para recarregar o GPS.

Informação e grupo de interesse

Pelo fim de 2015 descobrimos que tinha alguns brasileiros com interesse de participar na 1001miglia, e por iniciativa de Giuliano Guarini acabou sendo criado um grupo de interesse no facebook para troca de informações: 1.001miglia Brasiliani.

Em Janeiro 2016 abriram as inscrições e fiz inscrição o primeiro dia. Poucos dias depois foi confirmada a minha inscrição por e-mail onde foram mencionados os documentos adicionais a serem entregues com certificado médico emitido depois de Janeiro 2016 e um seguro de doença e responsabilidade civil para o tempo da prova.

Comecei a trabalhar com os dados disponíveis da prova no site oficial e tentar montar uma planilha para a prova para definir uma estratégia. Coloquei a planilha no grupo de interesse e para minha surpresa Giuliano Guarini retrabalhou e melhorou a minha planilha e a colocou a disposição de todos os interessados. Gostei do comprometimento! O grupo ficou ativo e presente durante todos os preparativos.

Planejando a viagem, e neste ano para o meu negocio conturbado em todos os sentidos , decidí viajar para Zurich o 5 de agosto, ficar treinando na casa dos meus pais na Borgonha ate o dia 11 e viajar de carro via Zurich para Nerviano, onde ficaria no Hotel Poli, recomendado pela organização, durante todo o tempo da prova.

Treino

Em termos de treino não fiz nada diferente do que nos anos anteriores, fora dos BRM 200 a 400 não fiz um treino acima dos 70 km. Me coloquei como meta ter pedalado entre rolo e estrada 5.500 km ate a prova, aumentando na França os treinos para diario pelo menos 2 horas de pedal. Consegui alcançar a kilometragem mas tive, que interromper o treino 15 dias em Julho devido a uma queda no BRM 400 Boituva. Estando qualificado para a prova deixei de fora os 600 do ARSP por considerar que a prova ficava muito perto do 1001miglia e não teria tempo para me recuperar.

Chegou o dia da viagem, todos os preparativos funcionaram, e viajei como previsto o 5 de agosto para Zurich. Os treinos na França foram perfeitos com temperaturas amenas e sem uma gota de chuva e me senti bem recuperado da minha queda.

Nerviano e redondezas

Fiz o check-in no Hotel Poli, onde a maior parte dos participantes iam estar alojados, como planejado no 12 de agosto sendo, como a simpática recepcionista me falou, o primeiro ciclista a chegar. O hotel realmente acabou sendo um lar provisório perfeito, com um custo-beneficio muito bom, quartos grandes, bem equipados com um bom ar condicionado, e um atendimento perfeito com bar e restaurante no prédio.

O meu companheiro de quarto Roberto Avellar chegou um dia mais tarde junto com Willian Previtalli e os irmãos Giuliano e Fabricio Guarini. O dia seguinte, 14 de agosto, Willian Roberto e eu acabamos visitando o lugar da entrega do material da prova o Monastero degli Olivetani e o lugar da largada o estádio municipal Re Cecconi na Via Piazza ambos em Nerviano. O nosso hotel estava muito bem localizado, ficava a somente 5 km da largada.

Nos dias seguintes garimpamos as redondezas, sob iniciativa de Willian sempre visitando as bicicletarias, e o Decathlon, e pedalando junto com os irmãos Guarini ate o Duomo de Milano passando pelo estadio do FC Milan San Ciro. O tempo ficou excelente, sempre com sol e temperaturas perto dos 30 graus.

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O Duomo de Milano, fonte: Roberto Avellar

O dia 14 chegaram Milton e Rafaella Della Giustina. Ambos ainda acabaram tendo que resolver alguns problemas de material. E não é que foi uma bicicletaria, bem perto do Hotel Poli, que salvou a prova de Milton e Rafaella Della Giustina? Rafaella tinha ficado treinando na Espanha e parece que colocando a bicicleta na mala bike na viagem de Espanha para Italia de alguma forma quebrou o cabo do trocador traseiro do seu sistema DI2, que deixou de funcionar. Milton tinha comprado um dínamo e um aro para montar uma roda dianteira, mas esqueceu, ou não achou, os raios.

Para achar um cabo de reposição, Milton entrou em contato com Shimano, Italia e parece que não deu certo. No final, o dia da prova, não tendo conseguido resolver o problema, falando do assunto no almoço, por volta das 14h, nos lembramos da loja visitada com Willian, perto do Hotel. Peguei o meu carro de aluguel e fomos, Milton, Rafaell e mãe dela, ate a bicicletaria. Para nossa surpresa, achamos tudo o que precisava. O gerente da loja era um ex-ciclista de ponta, que esteve na seleção de ciclismo da Italia e participou em mundiais e conhecia bem o DI2. A cena na loja foi divertida, o gerente trocando o cabo da bicicleta de Rafaella, fazendo funcionar o cambio, e Milton usando o alineador da Park Tool encima do balcão da loja para montar a roda. Deu tudo deu certo, a um preço muito econômico. Voltamos ao hotel, e a familia Della Giustina ficou pronta para a prova e devendo para mim e Willian um cafezinho.

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Pegando o equipamento da prova em Nerviano, fonte: Roberto Avellar

A largada

A largada era a partir das 20h30 do Estadio Municipal em Nerviano. Roberto e eu aproveitamos para dormir um pouco e pedalar por volta das 18 horas para a largada onde ainda teria jantar.

Saímos pontualmente, e para nossa surpresa, no caminho o pneu traseiro de Roberto furou. Roberto trocou e continuamos. Por sorte foi antes da prova. Chegando na largada, vi que tinha uma loja vendendo equipamentos, e perguntei se tinha uma bomba de pé. Mas não tinha. Interessantemente, na prova, nenhum de nos Paulistas, Mineiros e Catarinenses teve um pneu furado.

Na largada, entramos na fila do jantar que se movimentava bem rápido e serviam um jantar completo, macarrão, presunto com melão, sobremesa e bebida. Comida boa. Depois fomos para o estadio esperar a largada. Como em Paris o pessoal fazia fila na pista de atletismo dando a volta ate o controle de largada, onde faziam uma rápida vistoria dos itens obrigatorios, luz, colete refletivo, capacete e carimbavam o passaporte. Largavam grupos de 40 ciclistas.

A maior parte dos Brasileiros me incluindo, largou no último grupo que era um pontualmente as 21h 30.

Chegando a minha vez de apresentar o passaporte e fazer a vistoria, percebi que o tinha perdido na pista. Ai apareceu o meu anjo da guarda Willian Previtalli me entregando o meu passaporte. Parece que alguém achou o passaporte no chão, e gritou o número, o 13, William ouviu, pegou e me devolveu segundos antes da vistoria. Que susto, teria perdido a prova antes de largar!

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O briefing no dia da largada, fonte Danny Lu

Nerviano-Fombio-Colorno

Na primeira etapa iam batedores em motos na frente ajudando a bloquear a estrada nos cruzamentos para evitar acidentes. A etapa era plana e o ritmo ficou frenético. O meu GPS frequentemente mostrava picos de 40 km/h. Ainda assim, de alguma maneira nosso grupo de brasileiros conseguiu ficar junto Willian Previtalli, Roberto Avellar, Fabricio e Giuliano Guarani, Milton e Rafaella Della Giustina, Fernando Beduin e Jorge Rovetto.

A organização tinha avisado, que valia a rota da planilha, que as rotas de GPS não eram oficiais existindo divergências. Já nesta primeira etapa percebimos erros, o GPS nos mandou para uma estrada de terra, que acabava em uma estrada particular. Alguns pularam a cerca e seguiram, mas a maior parte voltou para outro traçado de rota ate encontrar outra vez a rota correta. O tempo passou muito rápido e chegamos no primeiro PC em Fombio, na beira da estrada em um estacionamento, com uma media acima dos 30 km/h. Não tinha infraestrutura, uma mesa com voluntários para colocar o selinho no passaporte, um espaço para deixar as bicicletas e uma fonte de água.

Completei as garrafas de água e depois de uns 15 minutos segui enfrente para o próximo PC em Colorno. O ritmo continuou frenético e acabei chegando um pouco depois das 5 da madrugada no PC, com uma media acima de 28 km/h. O PC ficava na praça principal perto de umas arcadas. Outra vez, nada de estrutura, uma mesa para colocar o selo no passaporte, uma fonte de água pública, nenhum banheiro e devido ao horário nenhum estabelecimento aberto.

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PC Colorno, fonte: Roberto Avellar

Colorno-Massa Finalese-Lugo

Nosso grupo de brasileiros acabou se encontrando de forma informal na praça, e vendo a falta de qualquer estrutura, depois de uns 30 min. acabamos seguindo todos juntos para a terceira etapa de 120 km, outra vez plana, com PC em Massa Finalese. Sabendo que tinhamos que comer alguma coisa partimos para etapa ficando atentos para algum lugar aberto onde pudéssemos nos abastecer. Amanheceu e a pedalada ficou mas calma. Seguindo a rota depois de uns 45 km encontramos um posto de gasolina aberto perto de Monteggiana. Paramos e aproveitamos para comer café de manhã e ir ao banheiro. Acho que a dona da loja de conveniência ficou muito surpresa de tanta demanda. Acredito que perdemos uns 40 minutos e continuamos agora acompanhando estradas beirando o Rio Po. Aqui tinha algumas bifurcações intrincadas, onde o GPS ajudou bem para manter a rota. Também percebemos que a rota estava parcialmente marcada com setas no asfalto dando a direção sempre marcadas com as letras “M1”. Saiu o sol e a temperatura ficou amena e com a vista do rio sempre ao lado fomos enfrente ate chegar no PC secreto de Fiume Po depois de 85 km na etapa.

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PC secreto Fiume Po, fonte: Roberto Avellar

Aqui, depois de aproximadamente 260 km a organização ofereceu pela primeira vez comida. Pegamos o selo no passaporte, comemos, fizemos algumas fotos, e o nosso grupinho continuou em um ritmo mais dosado, nesta fase, eu ajudando bastante na frente mantendo uns 28 a 29 km/h. Continuamos ate chegar em Massa Finalese, onde chegamos por volta das 10 da manhã, tinha comida e sendo um parque com árvores tinha onde sentar na sombra. Ficamos um pouco demais ate dormindo uma meia hora. Aqui Willian se despediu da gente, queria ir enfrente mais rápido e tinha perna para isso. Achamos normal e desejamos boa sorte.

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Dionatan Korb, Augusto Dosso, Nusso Lopes, Massa Finalese

Largamos para a quarta etapa de Lugo pouco depois de 12 horas. Com o sol no alto esquentou e pegamos um pouco de vento contra. Fomos avançando ate quase acabar a agua. Paramos em Gallo depois de 39 km na etapa em uma loja de conveniência. Nesta fase Roberto acabava ficando um pouco para atrás por sentir sono, mas de alguma forma continuava conosco. Paramos algumas vezes, Milton teve que trocar a bateria do seu Di2 duas vezes e uns 10 km antes de chegar em Lugo, paramos para pegar água. Continuamos e chegando em Lugo demoramos uns 20 min para achar o PC, porque a rota inoficial do GPS estava errada acabamos chegando em Lugo as 16h20.

Lugo-Dicomano

Sabendo que a próxima etapa para Dicomano teria uma boa subida, comi bem e abasteci e fomos embora no fim de tarde já sem sol e com a temperatura caindo. A subida começou e fiquei para atrás em relação aos outros do grupo. Segui no meu ritmo não forçando ate escurecer. Depois de aproximadamente 47 km em Misileo, depois de alguma subida, parou quase todo mundo na Osteria Il Castagno para abastecer. Isto, sabendo que depois a subida seria longa e nos últimos 10 km bem mais íngreme.

Comi e bebi bastante, descansei um pouco e sai antes que a turma, prognosticando, que seria mais lento e iam me alcançar. Já era de noite, temperatura amena e a subida ficava por volta dos 5 a 6 %. Avancei firme com marcha reduzida ate chegar em Palazuololo sur Senio, uns 55 km na etapa, onde começou a subida final de 10 km para o Passo Sambuca, 1060 m acima do nível do mar. A inclinação aumentou, coloquei na “vovozinha” e fui. Pedalando entre 7 e 8 km/hora os km passavam bem devagar, e a estrada estava muito bem sinalizada, mostrando ao avanço com uma placa cada 100 m o que aumentava ainda mais a sensação de lentidão. Fui subindo, de vez em quando alcançando algum ciclista e as vezes sendo ultrapassado por algum. Tudo parecia em câmera lenta. Os km foram passando ate que chegando no km 5 desci da bicicleta e comecei a empurrar. A temperatura tinha caido bem e tinha um vento cada vez mais forte. Continuei empurrando, e começei a sentir frio. Comi um gel e continuei em movimento. Do nosso grupo nenhum sinal ate então, ate que apareceu Roberto Avellar pedalando forte, cumprimentou e foi embora. Senti um pouco de vergonha, e no km 6 subi outra vez na bicicleta e pedalei mais 3 km ate ficar de saco cheio outra vez. Faltava muito pouco para o cume e o vento acirrou de vez, mas decidi chegar no topo pedalando. Deu certo e apareceu a bem-vinda descida com a última curta subida para depois descer por Razzuolo ate Dicomano. Cheguei por volta de meia noite no PC, cansado mas bem, tendo que buscar mais uma vez o PC. Do grupo não encontrei ninguém, e depois de comer uma macarrão frio, trocar umas palavras com o pai de Cesar Dosso fui dormir, já pensando na sexta etapa, curta mas com muita subida.

No dormitório, um ginásio tinha bastantes ciclistas dormindo encima de espumas. Não consegui nenhuma, e não tinha ninguém, que acordasse os ciclistas. Me estiquei no primeiro espaço que achei no chão, coloquei o celular para me acordar as 4 horas e dormi. No meio do meu sonho me lembro de ter acordado e visto Jorge Rovetto chegando no ginásio. E não sei como, cumprimentei ele, e avistando uma espuma livre, falei para ele de aproveitar. Dormi outra vez, acordei antes do alarme, juntei as tralhas, coloquei água nas caramanholas e parti para a sexta etapa.

Dicomano-Vallombrosa

Os primeiros 8 km eram planos, e a temperatura amena, nesta estrada rural, por volta das 4 da manhã, silencio total, não tinha uma alma a caminho. Fui pedalando leve, avançando ate chegar na esperada bifurcação onde começava a subida. Um pouco depois de Scopeti começou a subida para Castigloni. Peguei a esquerda começei a subir. parecia mais íngeme que a da etapa de Dicomano. Coloquei na “vovozinha” e para minha supresa estava subindo bem, no escuro, temperatura boa, fui girando. Apareceram outros ciclistas, uns mais lentos, outros mais velozes, fui indo. Entre outros, me ultrapassou um belga, pequeninho, Jan, muito alegre, me incentivando….

Descobri depois que tinha participado nos 1200 de Jan na Bélgica, onde tinham participado Hamilton Dinarte e Rodyer Cruz, e queria muito participar em uma prova de longa distancia no Brasil.

Os primeiros 4 km da subida eram os mais íngremes, depois foi mais fácil, e acirrou outra vez depois de 23 km por uns 2 km. Estava descansado, e não tive dificuldade. Assim, acabei chegando no amanecer em Vallombrosa por volta das 7 da manhã. Media:12,9 km/h. Seria a minha media mais baixa em toda a prova. Comi (mal), dormi uma meia hora encima de uma espuma que achei no PC e fui embora. Um PC precário em uma escola.

Dando uma olhada para a bicicleta, achei que o selim Brooks estava um pouco solto. Peguei a chave e apertei uma meia volta o parafuso para esticar ele um pouco mais, achando que ficaria melhor.

Vallombrosa-Chiusi-Montalese

Na sétima etapa para Chiusi-Montalese, tinha uma primeira curta subida e depois a etapa era plana, a estrada descia aos poucos ate um vale acompanhando o relevo e os pequenos pitorescos vilarejos. Saiu o sol e no caminho encontrei com muitas pessoas passeando ou correndo na estrada. Muitos dando “Bom Giorno”.

Pedalando tranquilamente, nas melhores condições possiveis. De repente, ouví um son metálico de alguma coisa quebrando. Continuei pedalando e olhando para baixo percebi que a ponta do meu selim estava completamente torta. Tinha quebrado mais uma vez a peça de titanio, que estica junto com um parafuso a ponta do selim. Uma das abas (borboletas) laterais quebrou. Esta foi a segunda vez. Esta peça não tinha nem 500 km de uso.

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O Vilão

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O remédio!

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Resultado final

Como sempre, infortunios deste tipo acontecem quando menos se quer. Um pouco mais de 600 km pedalados e ainda 1000 na frente. Acredito que a peça já tinha uma trinca, quando fui apertar o parafuso no começo da etapa, e com a tensão maior acabou quebrando definitivamente.

Parei na beira da estrada, perto de Pian di Sco, uns 20 km na etapa, e com uns “enforca gatos” tentei fixar o selim na ponta, com medo de que perde-se alguma peça ou quebrar o parafuso de fixação. Voltei a pedalar, percebi que funcionava, mas a ponta continuava caindo lateralmente e o selim tinha cedido bastante na parte central causando bastante incomodo.

Continuei pedalando, esquentou e passaram os km, e pouco apos de Arezzo acabou a agua. Descidi parar na próxima oportunidade para comprar agua e alguma coisa para comer. O que acabou acontecendo apos um pouco mais de 70 km em Pieve al Toppo onde encontrei um Supermercado (Punto). Sentei dentro do supermercado no ar condicionado para beber e comer sob sorriso do caixa. Depois fui ao parque ao lado para tentar melhorar a fixação do selim. Estava me incomodando demais no períneo e acabei um pouco assado. Consegui esticar um pouco o selim. Perdi outra vez quase uma hora.

Voltei ao pedal, e consegui um bom ritmo ate chegar em Montalesse onde devia estar o PC. Começei a buscar alguma placa indicadora….. De repente vi uns ciclistas saindo de uma estrada a esquerda e, por pura estupidez segui eles em lugar de olhar para esquerda, e não é que passei ao lado do PC?! Segui uns km ate perceber que a estrada estava subindo. Ai percebi que estava errado e voltei. Deu uns 10 km a mais.

Chegando no PC encontrei a turma brasileira. Como era o PC do primeiro drop bag, a maior parte já tinha tomado banho e trocado a roupa. Planejando fazer o mesmo, primeiro fui beber e comer alguma coisa, mas para meu azar neste PC, neste calor, somente tinha agua a temperatura ambiente. Quase falei para os volutuntarios comprem um cooler, “básico o meu querido Watson”. Bebi e comi o que tinha, um macarrão frio, peguei o meu drop bag e fui tomar banho. Por sorte Jorge Rovetto me emprestou uma toalha, como sempre não tinha nada a disposição da organização.

Dei uma olhada no selim, e tentei melhorar a fixação. Tendo acabado os meus “enforca gatos”, Roberto Avellar, por sorte, ainda tinha algum para me “emprestar”. Assim consegui melhorar a fixação. Cogitei na conversa, comprar um selim em alguma loja de bicicleta, mas acostumado ao meu, achei um risco maior. O Brooks avariado continuava funcionando, e decidi continuar assim. Roberto me perguntou se podia ajudar de alguma forma. Agradeci, e vendo, que já estava pronto para ir embora, falei para não se preocupar, que conseguiria me virar.

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Roberto largou na frente do resto da turma. Nos, os Guarini, Fernando Beduin, Rafaella Della Giustina, largamos um pouco mais tarde depois de dormir um pouco, para a oitava etapa de Todi. Milton Della Giustina, que tinha um problema no joelho, e somente tinha voltado a pedalar um pouco mais de um mes antes da prova, nos comunicou que ia desistir, que não estava recuperado, e achava melhor parar. Esta foi nossa primeira e única baixa.

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Lago Transimeno

Já fim de tarde, depois de passar ao lado de um lago, e errar pegando um pedaço de estrada bianca, entramos na segunda noite enfrentando as primeiras subidas em uma estrada em péssimo estado, que inclusive comparamos com as piores do Brasil. Um asfalto rugoso, com buracos, erosão e ate trincas. A pesar de ser uma etapa com muitas subidas, devido ao horario noturno a temperatura ficou amena e nos acabamos sentindo a vontade.

Somente me lembro, que em um subida íngreme junto com Giuliano Guarini e Jorge Rovetto, percebi, que ate na “vovozinha” estava duro pedalar. Giuliano que estava muito bem organizado com o seu GPS, mencionou que a inclinação estava em 11 %. Um pouco mais tarde comentei, que agora o pedal parecia mais duro ainda, Giuliano , simplesmente informou que era obvio, porque agora subia 13 %. Continuamos e ficou pior ainda, ai Giuliano mencionou que agora estava subindo 15 %. Pouco mais tarde, falei para Giuliano”Puxa agora ficou fácil” melhorou muito o meu pedal. E Giuliano, comenta: “Pois é agora somente são 9 %”. Não falei mas achei divertido: “Como tudo é relativo”.

Não me lembro muito mais desta etapa, somente sei, que continuamos firmes ate chegar em Todi, por volta de meia noite. O PC era em um restaurante, Bar Marianni Pizzaria, onde tinha pouca comida e nenhuma opção para dormir. Tinha planejado pedalar mais uma etapa antes de dormir. Mas com quase toda a turma junta, cansada e a próxima etapa curta com altimetria brava, acabamos nos esticando em um canto da pizzaria dormindo no chão.

Todi-Bolsena

Depois de 3 horas de descanso largamos, um pouco espalhados para a nona etapa, Bolsena, de somente 65 km mas com uma altimetria de 1300 m. Tinha esfriado, mas fui enfrente, um pouco na frente do resto. Tinha bastante subida, mas no escuro o tempo passou rápido, sem sono, no automático, como se estivesse em transe. Cheguei ja de dia um pouco antes das 8 horas. A última descida, a pesar do tempo nublado, com vista ao Lago Bolsena foi linda. E pela primeira vez não tive que buscar o PC. Segui a rotina de sempre, peguei o selinho do passaporte e fui buscar comida. Nos serviram um sanduiche quente, com um enorme pedaço de porco. Achei horrivel. Comi o pão e choguei o porco fora. Depois fui ao ginasio ao lado onde cochichlei um pouco.

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Lago Di Bolsena: fonte: Danny Lu

Apareceu Jorge Rovetto, que tinha um problema com um dos tacos da sapatilha bastante gasta, e decidiu trocar os tacos em uma bicicletaria recomendada pela organização. A turma se agrupou mais uma vez e largou junta, e esperou ate o Jorge nos alcançar, já com tacos novos.

Bolsena-San Quiririco-Castelnuovo Berardenga

Um pouco depois das 9 horas largamos todos para a décima etapa, uma das mais longas, com 120 km, para San Quiririco de Orcia, e altimetria de 1700 m. Foi uma das mais bonitas, cruzando a Toscana, passando em Pitigliano, uma cidade encravada no topo de uma montanha nas rochas. Nesta etapa pedalei com Jorge Rovetto. O dia começou a esquentar e depois de uns 30 km chegando em Pitigliano, vendo o monumental cenario, acabamos pousando na avenida principal em um restorante, reabastecendo. A cidadezinha estava cheia de gente e o ambiente estava animado. Jorge muito atencioso foi varias vezes pedir bebida e comida pagou tudo. Foi uma das paradas mais prazerosas durante todo o evento.

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Pitigliano, fonte: Susumo Furukubo

O resto da etapa passou rápido, o visual continuou imponente, e o ponto mais alto da etapa em Radicofani, depois de uma subida de aproximadamente 10 km foi conquistado, a pesar da dificuldade, cheio de satisfação. Isto com o tempo ajudando, o ceu ficando parcialmente nublado.

Chegamos em San Quiririco por volta das 19 horas e fomos abastecer imediatamente, e depois de um bom descanso fomos para a próxima etapa curta de Castelnuovo Berardenga. A etapa é bem curta e mais fácil, assim acabamos chegando no PC por volta das 23 horas. Sendo o segundo PC de drop bag, foi mais uma vez hora de banho e troca de roupa. Outra vez Jorge Rovetto foi muito gentil de me emprestar a sua toalha.

Castelnuovo Berardenga-Cerbaie Staffoli

A próxima etapa seria a mas longa de todas, 142 km ate Cerbaie Staffoli, que apelidei a etapa 13 morros. Pensando nisso contra a minha estratégia de dormir e Cerbaie Staffoli fui para um longo descanso. Esta vez pelo menos consegui uma espuma para deitar.

Saimos, toda a turma junta, para a longa 12 etapa por volta das 4 da madrugada, o quarto dia, sabendo que seria um longo e duro dia.

Chegando em Siena, achamos um bar e padaria aberta, e paramos para um café de manhã, em um Bar chamado Due Ponti, e bem comidos voltamos para a estrada atravessando a parte velha de Siena, passando ao lado da Piazza del Campo e Piazza del Duomo antes do amanecer.

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Siena, fonte: Diotan Korb

Continuamos enfrente, e de alguma forma me encontrei pedalando sozinho. Com temperatura amena, mas subindo, cheguei em San Giminiano, km 83 na etapa, por volta das 9 horas. Parei e abasteci agua bebi um cafe e comi um sanduiche no Café Giardino antes de continuar.

Apareceu outra vez o pequeno belga Jan, falando de pedalar alguma vez um BRM 1000 no Brasil. Convidei ele para o BRM 1000 das Bandeiras em São Paulo. Como todas as vezes, que encontrei com ele a caminho estava muito alegre, simpático e de alto astral.

San Giminiano, é muito bonito, o lugar muito bem cuidado encima de um morro com uma vista linda em todas as direções. Com certeza um lugar para se visitar como turista.

Esquentou e continuei para Il Castagno e Montaione, depois de uma boa subida a estrada fica no alto, mais uma vez, com uma linda vista panorámica.

Com suficiente agua e a estrada mais em descida para o PC continuei enfrente sem parar ate o PC onde acabei chegando por volta das 11 horas.

No refeitorio encontrei com Jorge Rovetto, que me falou que dormiu encima da bicicleta e caiu. Que achava que tinha quebrado a mão e tinha falado para a organização para ir ao hospital porque não teria condição de terminar a prova. Fiquei surpreso e ao mesmo tempo triste. Não tinha muito o que fazer da minha parte, era aceitar os fatos. Por sorte tinha um bom seguro que cobre os custos, e pelo que ouvi mais tarde, teve muita sorte. Porque saiu da estrada em uma descida, depois de tocar na bicicleta de Rafaella a alta velocidade. Do resto da turma não encontrei a ninguém.

Cerbaie Staffoli-Boveglio-Lago Gramolazzo-Gorfigliano

Fui para a 13 etapa de Gorfigliano com o sol a pique e sabendo que teria que escalar duas longas subidas, o ponto mais alto da segunda sendo o PC depois de um pouco mais de 100 km. Já depois de alguns km senti muito calor, e vendo que estava usando muita agua, parei rápidamente, depois de somente 10 km em La Capanna, no Ristorante da Coso, para providenciar agua bem fria e comer mais alguma coisa.

Em Collodi apos 21 km na etapa começou a primeira subida. Aproximadamente depois de 29,5 km na etapa dei uma descansada na beira da estrada. A subida ficou mais íngreme e fazia muito calor. Parei um momento bebi bastante e voltei a pedalar. Apos 32,5 km apareceu umda bifurcação para Colognora, onde fiquei na duvida se continuar na estrada ou pegar a bifurcação. Peguei a bifurcação, e o GPS indicou que estava saindo da rota, ai voltei para a estrada e segui enfrente.

Sentindo um calor insuportavel, dentro da interminável subida, desci da bicicleta e começei a empurrar. Já no alto, a vista era muito bonita, compensando o esforço. Uns 36 km na etapa, perto do Passo Colognora ao lado de Boveglio, nos participantes achamos, uma bela bica de agua fresca. Nem sabia que tinha tantos ciclistas na subida, na bica tinha um monte, todos abastecendo agua. Interessante foi também, que ciclistas que pensava, que estivessem bem na minha frente sempre voltavam a aparecer atrás de mim. Por exemplo um casal, um Búlgaro alto e jovem e uma joven ruiva, que mais bem parecia Americana, fortes e subiam bem, mas de repente achava eles parados em algum lugar descansando ou dormindo na beira da estrada.

A descida para Bagni di Lucca foi sinuosa, longa e íngreme, não dava para pegar muita velocidade, com um monte de outros ciclistas descendo tive que prestar muita atenção. Chegando na cidadezinha achamos uma sorveteria, Rudy Bar Gelateria. O lugar ficou lotado, todos comendo sorvete e comprando agua. Encontrei com Vitor Hugo Matzenbacher, mas cansados, não ouve muito papo. Uns 20 minutos mais tardes, depois de um monumental sorvete e muita agua, continuei.
Ainda faltavam mais de 50 km para o PC quase todos de subida, com a parte mais íngreme no final perto do Lago Gramolazzo. Continuava quente. Em Castelnuovo de Garfagnana, km 75 na etapa a rota atravessou a parte velha da cidade, com ruas bem estreitas, que estavam cheias de pedestres. Tive que prestar muita atenção para não fazer besteira. Em 2 lugares, desviando de obstáculos e pedestres perdi o equilibrio, e quase fui para o chão, uma vez me salvou um poste e outra um banco, onde consegui me apoiar. A sorte estava do meu lado. Com azar poderia ter sido bem diferente.

Olhando para o relogio, começei a duvidar se conseguiría chegar no PC antes das 22 horas, hora de fechamento e me esforçei ao máximo de manter um bom ritmo. As subidas agora passaram a parecer interminaveis. O único que me mantinha pedalando era ter sempre outros participantes juntos na mesma situação. Voltei a encontrar o enorme ciclista Búlgaro com a Americana. A pesar de muito mais jovens não tinham conseguido me distanciar. As subidas estavam ai para ser vencidas por jovens e velhos. Nos comprimentamos, e continuamos juntos alguns km, ate eles ficarem para atrás. Percebi, que ele acabava sempre esperando ela, que estava mais lenta.

Ficou escuro, e depois de uns 95 km na etapa, já acompanhando a beira do Lago Gramolazzo, a estrada ficou mais plana. Finalmente, depois de mais uma subida para Gorfigliano, cheguei no PC as 21h 25, um pouco mais de meia hora antes do fechamento do PC. Ufa! Pensei.

Estava morto, depois de pegar o selinho no passaporte fui para o refeitorio, que estava lotado, onde encontrei com os Guarini e Rafaella Della Giustina comendo. Serviam um macarrão puxado na agua, não tinha nem molho. Somente consegui beber, e comi umas poucas colheradas do macarrão, que estava sem gosto.

Conversando, com a turma, me falaram , que ficaram muito assustados com o acidente de Jorge Rovetto, que dormiu encima da bcicleta, e que pelas circunstancias, teve muita sorte. Falei, que tinha encontrado ele em Staffoli esperando a ambulancia.

Estava tão cansado, que decidi dormir. Fui buscar o dormitorio que ficava em um ginasio e para a minha surpresa tinha camas e cobertores. Estava ficando frio, e depois de ocupar uma cama, consegui um cobertor de um vizinho, que estava usando um de travesseiro. Coloquei o alarme para as 1h30 e fui dormir.

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Único lugar com cama Gorfigliano, fonte: Severin Devolder

Não ouví o alarme, e acordei um pouco depois das 2 horas, virei e dormi mais um pouco. Olhando por volta, percebi que não tinha quase mais ningúem. Sabia que estava atrasado, e decidi levantar tranquilo, juntar as tralhas e continuar quando estivesse pronto.

Depois da prova soube, que os Guarini tentaram me acordar, sem sucesso, na tentaiva de me acordar simplesmente dei um não neles. Assim, foram embora sem mim.

Gorfigliano-Piazza-Deiva-Marina

Me aprontei e largei para a etapa 14 de Deiva Marina. Passando em Gorfigiliano encontrei uns bares abertos em plena madrugada. Consegui agua para as caramanholas e bebi uma Coca Cola.

A temperatura estava amena e depois de uma curta subida começou a primeira longa descida. A estrada era, mais uma vez, estreita, íngreme e sinuosa. Não conhecendo a estrada, não consegui nem quis pegar muita velocidade descendo. Ainda assim, com um relevo leve, consegui pedalar quase 65 km nas primeiras 3 horas. O meu maior incentivo foram os outros participantes, que começei a ultrapassar no caminho. Sentia que não estava sozinho.

A quarta hora foi mais dura, porque teve uma subida de quase 10 km de comprimento. Depois veio a primeira descida para o mar em Levanto, que foi uma festa. Ver o mar na frente sempre é bom. Cheguei em Levanto já de dia, com muita fome, e parei na primeira padaria aberta que encontrei na Via Roma, uma das avenidas principais. Estava cheia de gente, também ciclistas. Sentei, e comi tudo o que podia, mini pizzas, sanduiches, café, chocolate, e abasteci as caramanholas. Ainda faltavam 15 km ate Deiva Marina com uma boa subida no meio.

Na minha cabeça, depois desta última subida teria uma longa descida ate o PC, mas não foi assim. Apareceram algumas subidas falsas e somente no final a descida. Com o GPS mostrando 101 km, comecei a buscar o PC. Não tinha prestado atenção, o PC ficava no Restaurante da Dona Fausta em Piazza, não em Deiva Marina. Chegando em Deiva Marina com o GPS mostrando 105 km, percebi que tinha passado o PC e tinha que voltar. Voltei a subir os últimos 4 km que tinha descido e cheguei no PC as 10h45. O voluntário do PC tinha deixado os selinhos acima de uma mesa, e cada participante que aparecia, colocava o selo ele mesmo.

Fui ao restorante, que ainda estava fechado. A dona se queixou, explicando, que não esperava mais ninguém, para ela tinha terminado tudo a noite anterior. Perguntamos quando abriria o restorante e a dona pediu que déssemos uns 15 minutos para se preparar, que depois poderia nos atender. Sentei em uma cadeira e dormi. Um meia hora depois, ouvindo barulho, vi que os ciclistas estavam sentando nas mesas. Ai perguntei em uma mesa, onde ainda tinha cadeiras livres se poderia sentar junto, a resposta foi positiva, e assim sentei com outros 5 ciclistas italianos. Pedimos bebidas e comida, e fomos muito bem servidos. Salada, presunto com melão, maccarão, uma salada de tomate ótima…… Como sempre, a melhor comida do mundo naquele momento.

A conversa na mesa ficou animada, e começamos a calcular, quanto tempo ainda tínhamos disponível para terminar a prova dentro do limite de 135 horas (em verdade a organização tinha falado de 140 h, mas não pensamos tão longe). Chegamos a conclusão que faltavam 258 km e tínhamos 24 horas disponíveis.

Deiva Marina-Casella Ligure

Paguei a conta no restorante, míseros Euros 15 para esse banquete, verifiquei se na tinha esquecido nada e larguei por volta de 13 horas em pleno calor, com mais uns 5 italianos para a 15 etapa para Casella com 90 km na frente. Primeiro enfrentamos uma subida de 10 km antes de descer para o mar.

Em Sestri Levante, com 24 km na etapa, e muito calor, acabou a água. Parei na Osteria Nazionale na Via Nazionale, bebi bastante, peguei água bem fria e fui enfrente. Pouco depois apareceu o mar com uma brisa refrescante, bastantes turistas, bastantes carros, tudo em um ambiente tranquilo e agradável.

Parei mais uma vez em um buteco depois de 50 km na etapa para pegar água e peguei a subida final para Sottocolle km 72. No topo parei em Scoffera para pegar água e foi onde encontrei pela primeira vez o Italiano, Giovanni Alboini, e a pequena Japonesa Akiko Obata, que estavam pedalando juntos. Eles saíram um pouco antes se despedindo. Pouco depois também fui para a última descida para o PC Casella onde cheguei por volta das 19h30.

Casella Ligure-Castellania

Depois da rotina do PC, se formou um “ grupetto”, largando do PC para enfrentar a curta penúltima etapa de 53 km para Castellania a cidade de nascimento do Campionissimo Fauto Coppi. Eramos 8 ciclistas, 4 italianos, 3 japoneses e eu. Giovanni Alboini nos liderava, pedalando sempre na frente, Akiko Obata atrás dele e nos, o resto, acompanhávamos disciplinadamente em fila indiana. A etapa era completamente plana ate o km 44, e a media ficou alta, por volta dos 26 km/h. De ai começou a íngreme subida para Castellania. O “ grupetto” se espalhou um pouco na subida, cheguei um pouco antes das 23 horas em Castellania. O PC era no monumento a Coppi. Os voluntários, eram um casal que cuidava do monumento e pareciam apressados a fechar. Não tinha dormitório.

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Castellania com a casa e o monumento a Fausto Coppi, fonte: Severin Devolder

Castellania-Nerviano

Depois da rotina padrão dormi um meia hora sentado em uma cadeira, mas ficando encima do morro, tinha muito vento, e assim, um pouco antes de meia noite o “grupetto” largou para a última etapa de 115 km. Outra vez, Giovanni pedalava na frente nos mostrando o caminho. Conhecia muito bem a região.

A temperatura tinha caído bem, e na descida do morro de Castellania ate o vale em Viguzzolo ficou frio. No vale, a um ritmo de 21 a 22 km/h voltou a esquentar o corpo, pedalamos por uma meia hora ate que alguns do grupo ficaram com sono. Percebendo, Giovanni nos levou a um posto de gasolina IP fechado, perto de Pontecurone, onde depois de nos empacotar conseguimos dormir sentados, encostados em uma parede do posto por umas 2 horas. Engraçado, que inicialmente sentamos no lado do posto onde ventava, e como alguns ficaram com frio, mudamos para uma outra parede mais protegida.

Por volta das 4 horas da manhã levantamos e continuamos. Ao amanecer, todo mundo com fome, paramos em uma padaria em Gropello Cairoli aproximadamente na metade da etapa final. A parada foi necessária e muito boa, cafezinho, chocolate e pão quente. Saimos fortalecidos. Na padaria encontramos com um alemão enorme, Volker Mailach, que se juntou ao grupo, mas para seu azar depois de pedalar uns kms juntos batendo papo, percebeu, que tinha esquecido a carteira na padaria e teve que voltar.

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Ponte Fiume Ticino-Bereguardo, fonte: Danny Lu

O “gruppeto” sempre sob direção de Giovanni, continuou a um ritmo de 20 km/h firme para Nerviano, faltavam somente 40 km. Nesta fase final ainda passamos encima de uma ponte provisória feita com vigas de madeira em Bereguardo muito interessante.

Devido aos espaços entre as vigas de madeira tinhamos que prestar muita atenção para não cair.
Perto de Nerviano, saiu o sol e aumentou a temperatura. Os km finais foram monótonos, estávamos todos simplesmente esperando chegar no PC final.

A chegada foi em pleno sol por volta das 9h30. Depois de entregar o passaporte, todo mundo foi comer tudo que tinha a disposição, macarrão, presunto com melão, café, suco, bolo de maçã e beber uma cerveja.

Agradeci muito a Giovanni, e abracei todo mundo, dei abraço em vários japoneses e dei uns bons beijos na buxexa de Aikiko. A reação dos japoneses foi engraçada ficavam duros, não tinham costume de demonstrações de afeto do tipo, mas acho que entenderam a intenção.

Depois sentei com uns italianos do “grupetto” e bebimos uma cerveja. Brasileiro não vi nenhum, mas acreditava que tinham chegado mais cedo.

Apareceu Volker Mailach o alemão da carteira, me pagou uma cerveja e ficamos batendo um bom papo uma meia hora. Acabamos trocando e-mails e nos despedimos.

Ficou pronta a medalha e o certificado e nos devolveram o passaporte. Peguei os meus drop bags, e fui pedalando para o Hotel Poli, onde cheguei por volta das 11 horas.

Roberto já estava no quarto descansando, porque tinha chegado a noite anterior. Tomei banho e fomos almoçar um banquete no restorante do hotel. Voltamos ao quarto e dormimos a tarde toda.

A noite nos juntamos para jantar e comemorar o meu aniversario, Roberto Avellar os irmãos Guarini, a família Della Giustina, William Previtalli, Fernando Beduin. Comimos como mortos de fome cada um contando as suas historias.
Olhando para a minha prova, tenho que confessar, que não consegui executar a minha estratégia e que no final me faltou gaz sob tudo por falta de uma alimentação apropriada. Ainda assim, acho que sou a prova, que também sem o apoio necessário, e todo tipo de imprevistos, da para completar a prova mais difícil dentro do tempo.

A organização da Mille Miglia, merece uma crítica. Não entendo, como com 400 participantes, e depois de 4 edições ainda as informações e a execução de quesitos básicos deixa tanto a desejar, como rota (rotas GPS com erros graves), dormitórios sem infraestrutura, bebidas quentes em pleno verão, macarrão frio, PCs onde o dono do lugar não foi informado devidamente, responsáveis de PCs com pressa para ir para casa, etc.

Conseguimos juntar uma turma mineira-paulista muito bacana para o 1001 miglia. Gostaria de agradecer a todos, William Previtalli que salvou a minha prova antes de começar, Roberto Avellar um companheiro de quarto tranquilo e sempre pronto para ajudar, Fabricio Guarini sempre alegre e positivo e especialmente Giuliano Guarini, que mostrou uma dedicação sem par nos preparativos da prova, sob tudo analizando a rota nos mínimos detalhes.

Também gostaria de parabenizar a todos os outros participantes Brasileiros de Florianópolis, Rio Grande do Sul e um Argentino/Floripense perdido entre Brasileiros tenham completado ou não pela sua participação.

13 de 16 Brasileiros completaram a prova e acredito que colocamos o Brasil pela primeira vez de forma expressiva no mapa dos LRMs.

Finalmente, gostaria de agradecer a minha amada esposa Fulvia, por ter permitido mais uma vez todas as horas de treino longe da família e as “férias” solo na Italia e a minha filha Julia por me alojar e alimentar após da prova na Suiça.

A Ciclo Ravena, que mais uma vez, não somente me emprestou a mala bike, mas sempre me deu um tratamento absolutamtente VIP de altíssima qualidade,
A Vô Joaquina, que me forneceu uma melhorada versão da bolsa de selim Vo Joaquina Jumbo para facilitar esta empreitada.

Desejo, muita saúde e sucesso a todos, e nos vemos na nossa próxima aventura, a mais tardar PBP 2019.

Abraços a todos e bom pedal,

Richard